Carta de Abu Dhabi III

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O telefone tocou às 11 da manhã. Atendi acho que ainda sonhando. “Você vai para o passeio em Dubai?”

“De jeito nenhum”.

“Então vai lá para o Yas Hotel, tá rolando a coletiva de imprensa (do UFC 112)”.

Dei uma bufada, e entrei direto no chuveiro para não desistir. Dezessete minutos depois eu estava por lá, claro que já tinha começado. Cheguei na hora em que os protagonistas da luta principal, o campeão até 84kg, Anderson Silva, e o desafiante, Demian Maia, eram apresentados.

Ed Soares, manager e tradutor, com Anderson Silva, cada vez melhor no inglês. Fotos: Luca Atalla.

Escaneei o ambiente rapidamente com os olhos e a primeira coisa que me chamou atenção foi o irmão mais novo do BJ, Reagan, numa miniplataforma montada para a TV nos fundos da sala. Sentado em posição borboleta, o primeiro Penn a ser campeão mundial (faixa-azul, 1998) estava com um Macbook Pro no colo, provavelmente atualizando o site do campeão até 70kg.

A única novidade da coletiva foi Anderson dispensar o tradutor para a própria apresentação. Mas só até as perguntas começarem, quando Ed Soares entrou em cena de novo.

De fato, tiveram poucas perguntas, e chegou a ser constrangedor. Apesar de eu não gostar dessas coletivas, eu até teria emplacado alguma para dar uma esticada, mas acho que estava tão sonado ainda que a cabeça ia em marcha lenta, e só consegui mesmo elogiar os óculos de grau do curitibano, quando os lutadores já se dirigiam para a frente de um painel para fotos publicitárias se encarando.

Um repórter perguntou ao Renzo e ao Hughes como era a pressão, pelo Renzo ter um vínculo ao país e ser bem conhecido lá.

Renzo respondeu que a pressão de enfrentar um lutador bom como o Matt Hughes é suficiente para que qualquer outro fator fique em segundo plano. Hughes respondeu que não sentia qualquer pressão, que teria muito mais se fosse lutar na cidade dele.

Conversei um pouco com o JD, o outro irmão de BJ, e lembrei de como eles contribuíram para a emissora CNN nas horas após o terremoto do Chile, no final de fevereiro. Esperava-se uma enorme tsunami passar pela baia de Hilo, no Havaí, e BJ ficou horas ao vivo para o mundo inteiro, mostrando a cena de lugar seguro, via skype.

BJ, sempre alerta – inclusive em relação a maremotos.

“Felizmente, a onda avassaladora não veio”, comentei o óbvio. JD suspirou e me contou como andava a academia deles por lá. Ele disse que estava muito bem, e que o forte era o Jiu-Jitsu, porque aulas de MMA eram só para alunos avançados.

Renzo me puxou para eu tirar da pasta o iPad e mostrar para um repórter, e logo se repetiu a cena que vem acontecendo desde sábado: juntou um grupinho para assistir e perguntar sobre o aparelho (Steve Jobs devia me mandar um cheque, porque acho que vendi diretamente uns 50 já). Um dos produtores se empolgou e comentou com Renzo: “Sem desrespeitar vocês, o highlight da semana é esse lançamento”.

Saí da sala assim que pude, e conversei um pouco mais com o resto da equipe do Anderson e com André Galvão. Se o Demian não se mostrava constrangido, André pensava diferente:

“É muito chato, a gente é amigo, minha mulher é amiga da mulher do Alejarra e dele, mas não tem jeito”. Me contou que antes da luta, não tem muita conversa nem sobre amenidades. Depois é outra história.

Renzo e Demian: últimos treinos.

Fomos para o hotel, onde Renzo pediu um sanduíche de queijo minas no saguão, e ali ficou trocando ideia com quem chegava. Rodrigo Minotauro chegou e parou por cinco minutos, mas se mandou já atrasado para um safari no deserto, em que teve que segurar os caras ainda mais meia hora, já que tinha um compromisso com o UFC.

Quando bateu 4h da tarde, os lutadores foram se dirigindo para a entrevista que será exibida no telão antes da luta. Na hora do Renzo, além do vídeo, o fotógrafo do UFC aproveitou para fazer uma nova sessão, “agora que você está numa forma física melhor”, justificou. “Tão me falando que eu tou com um corpinho de 18 anos”, brincou o Gracie, concordando com o argumento do craque das lentes.

Só para mudar a comida, ou o ambiente, saímos então do hotel Rotana e viemos para o que eu estou hospedado, o Crown Plaza, do outro lado da rua. E umas três horas sem o bochicho do evento depois, voltamos na hora do possivelmente último treino de sparring de Renzo antes do evento.

O time do Gracie então foi para a sala com os tatames que vem sendo usada diariamente, mas o primeiro que abriu a porta se constrangeu ao dar de cara com o Matt Hughes fazendo guarda. Ficou um silêncio rápido, até que Renzo viu o que estava acontecendo, soltou uma brincadeira com o adversário e foi para a sala ao lado, onde Demian terminava o aquecimento para cinco rounds de treino específico.

Renzo aqueceu e bateu manopla ao lado e depois fez três assaltos de luta agarrada, com Ricardo Cachorrão, Roberto Gordo e Sérgio Ignácio. A equipe de Demian ficou para assistir à movimentação até quase o final. Não cheguei a perguntar para o time de Demian, porque eles saíram antes, mas a trupe de Renzo e do próprio lutador ficaram bem satisfeitos com o desenrolar do treino e com a execução das posições praticadas hoje. Como todos também esperam um Matt Hughes em boa forma, a luta promete.

Hughes: sem pressão.

Já no finzinho, chegou o campeão mundial de Jiu-Jitsu Rômulo Barral, aqui para o World Pro da semana que vem, e, claro, para assistir ao UFC. Enquanto Renzo desacelerava, Rafael dos Anjos começou seu trabalho, e o Gracie deu pitacos em algumas posições. Rominho, que já tinha treinado por algumas horas, não resistiu e foi experimentar também. Foi quase todo mundo embora mas eu, Rilion, Gordinho, Gordo, (o sobrinho do Renzo) Riury e Sérgio Ignácio ficamos por ali por mais umas duas horas. De kimono, treinando e depois estudando posições. E se a carta de hoje tá meia torta, é já do torcicolo que arrumei nesse serão extra.

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