A lição de superação do GMI Rodrigo Boroski

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Rodrigo Boroski retornou às competições neste ano. Foto: Reprodução

Diante de competições de alto nível e da intensa rotina de treinos, manter a mente blindada é imprescindível para um atleta de Jiu-Jitsu. Fortalecer o lado psicológico em consonância com o aspecto esportivo é essencial para seguir motivado independentemente do desfecho da luta. Nosso GMI na Irlanda, o professor Rodrigo Boroski, no entanto, travou batalhas com o mais desleal e desumano dos adversários: o câncer. 

Rodrigo foi diagnosticado com câncer pela primeira vez aos 14 anos, quando não tinha conhecimento da gravidade da doença. Depois de três anos intensos, inúmeras sessões de quimioterapia e quatro cirurgias no cérebro, ele superou o primeiro duelo contra o meduloblastoma, um câncer neurológico. Mas este seria apenas o primeiro embate. O tumor voltou e, em seguida, sofreu uma mutação para linfoma não-Hodgkin. Na última cirurgia, Boroski sofreu uma parada cardiorrespiratória devido a uma embolia pulmonar. Ele ficou clinicamente morto por 5min19s e voltou. 

Em meio a uma vida de tantos confrontos, Rodrigo, à frente da Riders Jiu-Jitsu, retornou aos campeonatos e tem se destacado nos torneios. O faixa-preta está na 15ª posição no ranking mundial da IBJJF na categoria meio-pesado, e ocupa o 24º lugar no ranking mundial da AJP.

Em bate-papo com a equipe do GRACIEMAG.com, Rodrigo Boroski conta como o Jiu-Jitsu foi importante para ajudá-lo a superar as batalhas contra o câncer e comentou o retorno às competições.

GRACIEMAG: Como começou a sua história no Jiu-Jitsu?

RODRIGO BOROSKI: Minha história no Jiu-Jitsu começou aos 13 anos. Eu comecei no judô, que iniciei aos 4 anos de idade. Eu tinha amigos que treinavam Jiu-Jitsu, mas eu nunca havia me interessado, talvez por um pouco de preconceito e achava o judô muito melhor, até porque, na época, o Aurélio Miguel conquistou a medalha de ouro nas Olimpíadas de Barcelona, ele era meu ídolo. Mas um amigo me chamou para treinar e eu fui. Quando cheguei no treino, fui colocado para treinar com um faixa-amarela de Jiu-Jitsu. Lembro até hoje da queda, dei um ippon lindo e o esperei levantar. O professor olhou pra mim e disse “está esperando o que?” O Jiu-Jitsu continua no chão, a queda é só parte da luta. Eu tomei uma surra. Então decidi estudar as duas artes. Minha mãe adorou a ideia porque eu era hiperativo e quando chegava em casa,  só comia e dormia depois da escola.

Como a filosofia do Jiu-Jitsu foi importante para você superar os momentos mais difíceis da sua vida? 

Eu sempre fui disciplinado, e meu sensei de judô trabalhou isso, mas no Jiu-Jitsu eu aprendi a ser amassado, literalmente, e perdi o medo de treinar com pessoas maiores, aquela situação claustrofóbica. Eu tinha ego, resistia para não bater e, aos 14 anos, o câncer veio pela primeira vez. Na época, eu não tinha ideia do que era câncer, achava que era uma doença normal e tiraria de letra. O mesmo pensamento que tive ao enfrentar o faixa-amarela, a lei do engano (risos). Descobri aos 14 anos que podemos ir ao inferno quando estamos  vivos. A primeira batalha contra o meduloblastoma durou quase três anos. Foram quatro cirurgias no cérebro, inúmeras sessões de quimioterapia. O câncer  voltou e ainda sofreu uma mutação para linfoma não-Hodgkin. Na última cirurgia, tive complicações cardiorrespiratórias devido a uma embolia pulmonar. Fiquei clinicamente morto por 5 min19s e voltei. Depois de todos os tratamentos devido ao câncer, como quimioterapia, radioterapia e cirurgias, tive um problema cardiovascular em razão dos longos tratamentos contra a doença: ciclofosfamida e taxol. Fui operado e tive um AVC durante a cirurgia. Toda aquela pressão nos treinos de Jiu-Jitsu, a claustrofobia, exaustão de treinar com pessoas mais pesadas, mais fortes, me ensinaram a não desistir. Câncer é fácil, difícil é resistir à pressão do Muzio de Angelis, meu professor, ou tirar o Igor Silva da montada (risos).

O que te motiva a competir?

O que me motiva a competir é mostrar para quem está perto de mim, aos meus alunos, que vamos ganhar e perder, que o medo não existe, situações perigosas, sim. Mas o medo não é real, o medo é um sentimento de imaginação de situações futuras que podem nunca vir a ocorrer. Gosto de ver meus alunos focados e de motivar quem está ao meu lado que tudo é possível de ser realizado com muita disciplina, foco, determinação e fé.

Rodrigo Boroski celebra vitória em torneio da IBJJF. oto: Reprodução

O que esse retorno às competições representa para você?

A competição em si não representa absolutamente nada e, ao mesmo tempo, representa tudo. Por que nada? Porque por tudo que já vivenciei, ir a 38 funerais de pessoas que estavam em situações de tratamento melhor que eu, machuca. Pensar que você possivelmente será o próximo, porque está clinicamente mais debilitado e depois ressurge, sobrevive. Poder vestir o kimono, amarrar a faixa, dar o soquinho e, por alguns minutos, ficar em pé é incomparável. Por isso, a competição em si não representa nada. Ganhar, perder não é nada. E representa tudo porque quando você chega em uma competição e vê todas aquelas pessoas, muitas delas nervosas e tensas, mas estão lá, na luta contra os próprios medos. Adoro chegar nas competições e olhar os faixas-brancas, olhar para eles e relembrar o nervosismo, encontrar meus amigos, fazer aquela resenha, torcer por eles. Amo estar nas competições e isso me mantém vivo. Vou competir no Roma Open, Abu Dhabi World Pro e Paris Open daqui a 11 dias. Vou percorrer dois continentes, isso me motivou a voltar a competir, me faz sentir vivo, independentemente dos resultados.

Quais foram as maiores lições que o Jiu-Jitsu te ensinou ao longo desses anos?

O Jiu-Jitsu me ensinou a ter, acima de tudo, humildade. No tatame, lidamos com todos os tipos de pessoas e qualquer um pode te passar o carro. O esporte me ensinou  a palavra perseverança, porque o caminho é árduo, não só até a faixa-preta, porque o sonho é ser faixa-preta, depois da tão almejada faixa é se defender, já que todos abaixo querem te superar (risos). Jiu-Jitsu me ensinou a lapidar minha disciplina, treinar com dor, fratura, debilitação física. Por isso, treine com disciplina e vá ao ao treino mesmo diante de todas as adversidades.

Que conselho você daria ao nosso leitor para que ele possa superar qualquer batalha na vida?

Eu não gosto muito de dar conselhos, porque se isso ajudasse não teriam tantos livros de autoajuda e pessoas deprimidas. Mas o que eu faço é acordar todos os dias e simplesmente agradecer por estar vivo, não sou de reclamar de situações adversas. Não muda a situação que naquele momento nos encontramos. Chore, mas siga sua caminhada, o mundo não para por nossa causa. Eu sempre optei por não chorar e sempre sorrir mesmo com dores. Muitas pessoas achavam que eu iria morrer, então eu jamais quis que a minha última imagem fosse triste, mas sempre com um sorriso no rosto. As pessoas precisam aprender a parar de reclamar, Como sempre digo, Jesus não me prometeu que eu não teria dores em minha vida, mas que estaria sempre ao meu lado em todos os momentos. Não tenho religião apenas acredito em Jesus Cristo, acredite em algo, isso nos dá uma força motriz, como diz São Paulo, “o poder não está em um homem mas em todos, em você, em mim, em todos”. Faça sua parte e os resultados virão.

 

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