O choro do ministro faixa-preta

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O faixa-preta Luiz Fux, o mais novo membro do STF. Foto: Arquivo Pessoal.

Foi mais uma vitória de lavada do Jiu-Jitsu: 68 a 2. Por esse “placar”, o ministro Luiz Fux foi aprovado pelo Senado brasileiro e nomeado ontem para a mais alta instância do país, o Supremo Tribunal Federal, a nata da nata dos juízes no Brasil, algo como a Suprema Corte americana.

Fux, que havia sido indicado pela presidenta Dilma e, segundo a Revista “Veja”, era um dos favoritos do superministro Antonio Palocci, foi sabatinado por quatro horas pela Comissão de Justiça brasileira, e foi aplaudido de pé por todos os 23 integrantes. Ao final, foi às lágrimas, como um campeão ao vencer.

A vitória também foi do Jiu-Jitsu porque Fux é um dos mais ferrenhos defensores da arte, a qual pratica há 30 anos com mestre Osvaldo Alves, desde antes de se tornar juiz.

Entrevistado por Luca Atalla na GRACIEMAG #93, ele disse como a arte suave o ajudou a enfrentar todas as dificuldades e chegar ao topo. Confira o artigo, publicado em 2004, na íntegra:

Autoconfiança, a balança e o relógio

“Sempre faço questão de colocar o Jiu-Jitsu no patamar que a arte merece. Porque acontecem situações desagradáveis, de pessoas brigarem na rua e surgirem instantaneamente a acusação de serem praticantes, o que não acredito. Afinal, basta pegarmos os ídolos do esporte e vermos que, com raríssimas exceções, ninguém nunca brigou. Este é o Jiu-Jitsu, uma arte marcial para o homem que tem boa índole.

“O início da minha relação com o Jiu-Jitsu foi interessante. Após uma corrida na praia de Copacabana, deixei minhas coisas na areia, fui dar um mergulho e roubaram meu relógio. Uma senhora me apontou os ladrões, mas o grupo muito grande me intimidou, e não tomei satisfação. À noite, dando aulas na PUC-Rio, comentei a história e lamentei o sentimento de impotência que me afligiu. Foi então que um aluno se ofereceu para tomarmos uma atitude com a ajuda de amigos que conheciam a área.

“E, no fim de semana, junto com os futuros faixas-pretas Sérgio Penha e Márcio Santos, abordamos o grupo. Acabei recuperando o relógio sem qualquer confronto, e notei como o bando ficou aterrorizado com a presença dos lutadores, apesar de eles não serem grandes. Perguntei para meu aluno de onde tiravam toda essa autoconfiança e soube que era do Jiu-Jitsu. Pensei: vou fazer isso também. Foi quando conheci o professor Osvaldo Alves e comecei a treinar. Eu tinha 26 anos de idade, portanto há 25 anos.

“O Jiu-Jitsu demanda disciplina e dedicação, pois é um esporte difícil, com posições bem elaboradas. E nos primeiros anos, quem pratica sabe, a arte deixa o sujeito completamente envolvido, pensando em posições até andando de ônibus. Foi essa dedicação, disciplina e atenção à técnica que transpus para o estudo. Hoje, consigo estudar com disciplina por até seis horas por dia, sem parar. Graças ao Jiu-Jitsu.

“Tanto que, quando fiz o concurso para magistratura, foi no auge da minha fase de dedicação, em 1982, com um ano e meio de treinos. Coincidiu com a época em que o Sérgio Penha ia lutar com Rickson, e eu o acompanhava na preparação. De madrugada subíamos a ladeira Santa Leocádia, corríamos na areia com um companheiro nas costas, numa preparação física e técnica absolutamente inigualável, puxada pelo Osvaldo.

“Então, eu malhava, fazia Jiu-Jitsu, estudava e não me sentia cansado, porque estava bem fisicamente. Com tudo isso e, claro, a ajuda de Deus, porque tenho uma fé muito grande, tirei primeiro lugar no concurso, mesmo sendo muito jovem e me tornei juiz.

“Além da disciplina no estudo e de ter ajudado na minha rigidez física, o Jiu-Jitsu também me ajudou na disputa por posições na minha carreira, pelo fato de eu ter apreendido seus princípios, sua ideologia. Quando disputei o cargo de ministro, não faltaram pessoas a me esmoerecer nesta caminhada, a dizer que eu era muito jovem, que não devia perseguir a posição. Mas aquela coragem, a ousadia, a determinação e a autoconfiança que aprendi nos treinos sempre me levou a prosseguir.

“Desde cedo fui muito perserverante, e decidi que precisava estudar desde pequeno para realizar meus objetivos, mas o Jiu-Jitsu exarcebou essas qualidades e foi fundamental para as minhas conquistas profissionais.

“A ideia de coragem, de ousadia no limite da responsabilidade e de respeito ao próximo que o Jiu-Jitsu transmite me ajudou também no decorrer da carreira de juiz, porque como magistrado você precisa ser independente e ter vigor para enfrentar as dificuldades. Você está resolvendo o problema alheio, mas ao mesmo tempo se depara, por vezes, com uma guerra existencial, porque tem que decidir o destino das pessoas, e deve ter a independência e a atitude para tal. Por outro lado, você também deve se impor pela postura, uma postura altiva, de humildade na hora certa, mas também de ousadia no momento certo, porque você pode sofrer pressões de todos os níveis.

“Acho fundamental para o ser humano este desprendimento, esta disposição de não temer, porque a pior sensação é o medo do medo. Você tem de ter medo sim, dos perigos que conhece, por uma questão de responsabilidade. Ao atravessar a rua, você deve olhar o sinal por temer ser atropelado. Mas não pode ter medo daquilo que é desconhecido. E o Jiu-Jitsu dá, de antemão, a prevenção desta sensação, por meio da autoconfiança. A arte ensina que, se eventualmente você estiver numa situação-limite, na pior das hipóteses vai saber se defender.”

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