Um certo Tererê em Porto Alegre

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Fotos: Ivan Trindade

A vida de Fernando Tererê, 31 anos, é notória por ser repleta de glórias e tragédias.

As glórias foram todas conquistadas de kimono, frutos de um talento único.

“Fui campeão mundial da faixa-azul à preta”, relembra.

A rotina de conquistas principiou em 1997, quando aos 17 anos venceu o peso leve.

A cada ano que passou, Tererê subiu de faixa e manteve-se no alto do pódio.

Em 98, foi bicampeão na roxa; em 1999, tricampeão na marrom.

No ano 2000, estreou na faixa-preta e sagrou-se tetracampeão mundial.

Em 2001, foi vice, perdendo a final do médio para Vitor “Shaolin” Ribeiro.

Em 2003, viveu seu grande momento. Sagrou-se bicampeão mundial na faixa-preta (e penta no geral) ao finalizar Marcelo Garcia na final do médio.

Desde então, ninguém mais conseguiu nem ao menos derrotar Marcelinho na categoria, quanto mais finalizá-lo.

Em 2004, ao invés de defender seu título, resolveu se testar entre os grandões, se inscrevendo no pesadíssimo, mesmo pesando menos de 80kg.

Terminou vice-campeão, perdendo apenas para Fabrício Werdum.

Foi em 2004 que os problemas se tornaram tragédias.

Depois de duas semanas dando seminários nos Estados Unidos, Tererê sofreu uma crise psiquiátrica no voo de volta entre Miami e São Paulo.

Apenas três anos depois do 11 de setembro, a interrupção da paz dos passageiros foi tratada com a máxima severidade e o carioca terminou preso por 30 dias na Flórida.

À grande crise, seguiram-se mais problemas psicológicos que o álcool e as drogas só fizeram piorar.

“Fiquei seis anos longe do Jiu-Jitsu. Foram seis anos sem vestir o kimono”, enfatiza Fernando.

Nesses seis anos, volta e meia reaparecia, mas não parecia bem. As notícias que chegavam eram cada vez piores.

O diagnóstico era de depressão profunda. Em 16 de novembro de 2009, seu aniversário de 30 anos, o GRACIEMAG.com ligou para sua casa, no morro do Cantagalo, zona sul do Rio.

Sua mãe, Regina Helena, atendeu, mas não trazia um sorriso na voz: “Ele fica no quarto quase o tempo todo. Fizemos um bolo e cantamos parabéns, mas acho que ele não entende muito bem o que está acontecendo”.

Apesar do quadro, Helena tinha uma certeza: “A família não vai desistir nunca!”

Dias depois da ligação, uma nova notícia chegou, e essa trazia alento.

Finalmente, Tererê tinha concordado em se internar em uma clínica para tratamento da depressão e do uso de drogas, o crack inclusive.

“Passei por essas clínicas e me desintoxiquei totalmente”, relembra Tererê.

O caro tratamento foi custeado por amigos, conhecidos e fãs. Estrelas como Marcelo Garcia, Bráulio Estima, Rômulo Barral, entre outros, colaboraram com seminários, leilões e doações para custear a clínica no interior de São Paulo.

Em março de 2010, as notícias já eram melhores, o campeão já ganhava peso e sorria novamente. Em maio, voltou aos treinos com Alexandre “Gigi” Paiva, na Alliance Rio. Em junho estava no México, dando  seminários. Em julho, voou para a Europa. Passou por Inglaterra, Polônia, Irlanda, Espanha, Suécia, Suíça, Portugal e Itália em mais de três meses de viagem.

Em 2011, Tererê seguiu fazendo mudanças em sua vida. Em agosto, casou com a inglesa Sasha Hook. Agora pretende ir morar no país da amada.

“Estou esperando apenas o visto ser liberado para ir”, revela.

Antes de viajar, segue ganhando a vida com seus seminários. Num desses, o encontramos no início da  noite de ontem, em Porto Alegre.

A academia de Mário Reis, que recentemente se mudou para a Alliance, está lotada.

Quando Tererê chega, é saudado por todos, muitos faixas-brancas e azuis que jamais o viram lutar, a não ser na internet. Mesmo assim, a reverência e o apoio estão ali.

“É esse carinho e apoio que me fazem seguir em frente”, comenta Fernando, já de kimono personalizado do seu novo patrocinador, a Tatami Fight Wear.

E seguir em frente também quer dizer voltar aos EUA, sem medo.

“Quero ir treinar com meus amigos lá, o Cobrinha, o Michael Langhi, o Lucas Lepri”, anuncia.

Mas será que a prisão em 2004 não vai atrapalhar?

“Eu não fui deportado, então, não será impedimento para conseguir novo visto”, responde.

Antes dos EUA, a volta à Inglaterra, para o reencontro com a esposa Sasha e para colocar em ação os planos para um futuro melhor.

“Quero montar minha própria academia ter meu próprio time, mas no início vou seguir minha rotina de seminários. É deles que eu estou vivendo desde que saí da clínica”, lembra.

Mário Reis já encerrou o aquecimento dos alunos. Antes de passar a primeira posição da noite, chama todos os alunos para o seminário de Tererê, dali a duas semanas.

“São 60 reais para aprender com uma lenda! Ninguém pode perder essa oportunidade de aprender com quem ensinou Cobrinha, Langhi, André Galvão, foi professor do Ramon Lemos e muitos outros”, reforça o gaúcho.

Depois de fazer fotos para uma matéria a ser publicada em GRACIEMAG, Tererê concorda em ensinar uma posição em vídeo.

Mostra uma raspagem de gancho que termina em um armlock.

Se empolga e resolve mostrar a mesma posição para todos os alunos.

As instruções saem naturais, Tererê repete-as, reforçando os detalhes.

Todos prestam a máxima atenção. Vários sacam seus telefones para filmar a explicação.

Posição ensinada, Tererê observa enquanto todos tentam repetir seus movimentos.

Antes de sair, fazemos a última pergunta. Quando o veremos de volta às competições? Seria fantástico vê-lo no Europeu 2012.

Ele sorri e responde enigmático, voz suave: “Estou ganhando carcaça!”

Seguimos na torcida.

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