Do baú: Roger contra sete campeões mundiais

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Esqueça o que os fãs e comentaristas acham de Roger Gracie. Nesta entrevista, publicada na edição de GRACIEMAG especial do Mundial, procuramos saber como os melhores do mundo veem o único tricampeão absoluto do planeta.

Rodrigo Cavaca (CheckMat): Roger é o maior campeão de todos os tempos do Jiu-Jitsu. Quanto tempo antes do Mundial você começa a se preparar para a competição, e quanto tempo passa treinando com o pessoal todo da Gracie Barra?

Treino uma semana com o pessoal da Gracie Barra na Califórnia, e começo a preparação quando faltam 11 a 12 semanas para o campeonato. É quanto intensifico o treinamento, treinando duas vezes por dia.

Cavaca: Um dia pensa em voltar a morar no Brasil ou está totalmente realizado com sua vida em Londres?

Por enquanto é muito difícil para mim voltar a morar no Brasil, pois estou abrindo a terceira academia em Londres, nem que eu quisesse eu poderia voltar. Mas não penso em morar em Londres para sempre, não. Tem também meu filho Tristan, de 1 ano, que vai começar a estudar na Inglaterra, então não volto tão cedo. Mas para sempre é muito tempo, um dia pretendo morar no Brasil de novo, sim.

Bernardo Faria (Alliance): Roger, eu sinto que evoluo muito depois das derrotas, vejo onde estão meus erros e trabalho em cima deles, por exemplo. Mas você praticamente não perde, então como faz para seu Jiu-Jitsu evoluir somente com vitórias?

A gente na realidade deve aprender tanto na vitória como na derrota. No campeonato, podem haver erros variados, como erros táticos, erros de preparação etc. Mas só no treinamento você constata as falhas do seu Jiu-Jitsu.

Bernardo: Como é sua rotina de preparação física durante o ano?

Quando não estou competindo faço um treino visando à força e a explosão, três vezes por semana no máximo, sem muitas repetições. Com campeonato eu mudo o tipo de treino, faço mais repetição de olho no condicionamento físico, deixando de lado força e explosão.

Marcelo Garcia (Alliance): O que o fato de ter nascido em berço Gracie mais o ajudou?

O que mais me ajudou, acredito, foi o incentivo. Na família o estímulo é grande, vem de toda parte e existe o tempo todo. A gente também se espelha nos familiares, e tem o apoio de muita gente, inclusive o apoio técnico. Pude aprender diversos detalhes técnicos vindos de diversas pessoas.

Marcelinho: Hoje sinto que a gente se fala melhor, mais calorosamente, do que nos anos em que estávamos nas mesmas chaves do absoluto. É mera impressão minha, ou você encara diferente quem é seu adversário na véspera da competição? O fato de não lutarmos mais mudou algo?

No dia da luta, na verdade, eu evito contato com todo mundo. Mas especialmente com quem eu vou lutar, não quero ficar batendo papo contra quem vou enfrentar logo mais. Não é que eu tenha algo contra você ou qualquer adversário, mas quero ficar concentrado para lutar contra você ou outro. Depois que acaba, no entanto, estou 100% bem com todo mundo. No pódio até alguém veio brincar, “ué, nunca te vi rindo”. Eu respondi, agora que acabou é só risada..

Tarsis Humphreys (Alliance): Qual sua dica para eu ficar com um Jiu-Jitsu tão justo quanto o seu? Como você treina na Inglaterra, longe muitas vezes dos Estimas, do Lagarto e outros faixas-pretas duros?

Na minha visão não se deve só treinar por treinar. O negócio é o objetivo que você cria a cada treino. Claro que há dias que o treino não rende tanto, você só está lá na academia, mas você precisa direcionar o treino para alguma coisa específica, para alguma melhora.
Se você só se embola, não trabalha precisamente os seus erros. É preciso realizar um treino específico para cada posição, foi o que sempre fiz desde novo, e continuei na Inglaterra. Independentemente de com quem eu treinava, pois nem sempre tinha os Estima e o Lagarto comigo em Londres.
Uma dica é enfileirar os alunos, pois você começa a treinar cansado, e passa a se igualar com o alunos menos graduados. Outro ponto é sempre se colocar em situação de perigo, em posicoes que o pessoal nao gosta de se botar, por vaidade. Porque as vezes nego te finaliza e você fica puto, mas é importante deixar o ego de lado para sentir como sua cabeca trabalha no treino. Contra alguem duro no campeonato, vc vai saber escapar dali, porque ja praticou no treino.

(Especialistas tentam decifrar o estilo de Roger, confira no vídeo abaixo.)

Michael Langhi (Alliance): A primeira é em relação à mente. Como você consegue se motivar para mais um Mundial após tantas conquistas? Da onde você tira a motivação para treinar?

Como tenho o Jiu-Jitsu 100% envolvido na minha vida, se ha uma competicao como o Mundial acontecendo e eu estou fora, me sinto lesado, sinto a obrigacao de participar, independente de ter conquistado títulos.

Eu não estou nem aí para títulos, não ligo, o que penso é no confronto, luta a luta. E eu sei que, se nao estou fisicamente bem, sei que nao vou conseguir fazer nove lutas como venho fazendo, e minha técnica não será suficiente para vencer o oponente. Tento me superar em todos os detalhes, superar minha técnica, parte em pé, parte no chão, parte física. Busco a perfeição como lutador de Jiu-Jitsu, sabendo que ela não existe.

O que me motiva é saber que sempre eu posso fazer melhor. Muita gente para no tempo porque pensa no título, em vez de pensar em fazer melhor no ano seguinte. Eu não estou nem aí para títulos, para o tri, para os recordes. Quero chegar no limite. Mas claro que gostei do troféu, é sempre bom ser reconhecido por aquilo que a gente faz. Agora, se não tivesse troféu eu ficaria feliz do mesmo jeito.

Langhi: Como você mantém seu corpo no ritmo lutando apenas um campeonato por ano, finalizando todo mundo e ainda entrando e saindo com a boca fechada, cheio de gás?

Duas , três vezes por ano eu compito, seja MMA ou sem kimono. Mas 12 semanas resolvem, se você o ano todo está com 30, 40% da sua forma física.

Rafael Mendes (Atos): Uma situação de luta: você está perdendo a luta por dois pontos, e coloca um gancho nas costas do adversário a 30 segundos do fim; você tenta finalizar, mesmo correndo o risco do adversário resistir, ou coloca os ganchos para garantir a vitória?

Já me vi em situações parecidas, tentei estrangular e perdi a luta. Já fui prejudicado por pensar sempre no ataque, e não nos pontos, pensando no jogo ofensivo. Hoje, pensando em tudo isso, acho que eu iria pelos pontos, mas minha cabeça sempre pensa na finalização. Eu botaria o gancho, hoje. Pelo menos agora. Na hora de repente eu iria no pescoço (risos).

Rafael: O que acha que pode melhorar no seu Jiu-Jitsu?

Todos os aspectos. Defesa, costas, montada, meia-guarda, parte em pé, ataque do lado. Sei que sempre vai ter um detalhe ainda despercebido que vai fazer uma diferença gigante no meu jogo. Só de você saber que precisa melhorar você já está melhorando. Se você acha que não tem o que melhorar, já está piorando em tudo.

Pablo Silva (Gracie Barra): Após ganhar todos os títulos possíveis no Jiu-Jitsu, quais seus objetivos para 2011? O que planeja para sua carreira em termos de MMA?

O objetivo para 2011 é copiar 2010 (risos). Ou superar o que foi feito. No MMA entendo que o tipo de adversário vai cada vez piorando, isso é natural e vai continuar acontencendo, até eventualmente eu chegar a enfrentar o campeão da categoria, se for o caso. Mas não vejo luta de MMA de ninguém, deixa acontecer que a gente passa a se preocupar. O plano é lutar o próximo Mundial, fazer uma luta de MMA este ano e mais duas no ano que vem. Estou pensando em lutar o World Pro 2011 em Abu Dhabi também, mas nada certo.

Bruno Malfacine (Alliance): Qual o segredo nos treinos para tudo parecer tão fácil durante as lutas?

Não existe segredo, não existe fórmula de treino secreta para a luta parecer fácil. A luta pode parecer fácil para quem esta assistindo, mas para quem esta lá dentro pode ter certeza de que esta sendo muito difícil. O lance é estar 100 % tecnicamente, fisicamente e mentalmente para a hora do campeonato. Se alguém souber o segredo, me diga.

Bruno: Qual sua meta de vida – você pensa na fama, ser um bom professor, um campeão de MMA?

Eu não luto para ser famoso, eu escolhi isso pra minha vida e só penso em lutar. Minha meta é essa, e quando acabar minha carreira de lutador vai começar provavelmente a carreira de professor. Mas deixa uma acabar antes para eu pensar na outra.

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