A arte de espantar a zona de conforto, com Cristiano “Titi” Lazzarini

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Cristiano Titi, nosso GMI da BH Rhinos. Foto; Arquivo Pessoal

* Artigo publicado originalmente nas páginas da GRACIEMAG #272. Para mais conteúdos exclusivos com o melhor do Jiu-Jitsu mundial, assine a revista mais tradicional do esporte em formato digital *

Ao abraçar o MMA e a carreira sem kimono no início dos anos 2000, Cristiano Lazzarini ficou conhecido pelos torcedores por sua pressão em pé e sua guilhotina. Na academia, contudo, o “Titi” da Gracie Barra-BH é muito mais que um caçador de pescoços. “Entre todos os meus alunos, o Titi é um dos que possui o jogo mais completo”, atesta Vinicius “Draculino” Magalhães, fundador e líder do time de Belo Horizonte, que em 1995 começou a ensinar aquele praticante de muay thai a lutar no chão. “O Titi por cima é conhecido, mas também tem uma defesa por baixo ótima, tem gás, calma durante a luta… E é um cara que treina incansavelmente até hoje”.

A equipe GRACIEMAG foi bater um papo com Cristiano, hoje professor da BH Rhinos em Belo Horizonte, para entender como funciona a mente do lutador que detesta a temida “zona de conforto”, e não para de evoluir jamais.

GRACIEMAG: Qual é o papel da cabeça do lutador que quer se tornar completo, que não limita seu jogo nem pensa em conforto?

CRISTIANO “TITI” LAZZARINI: O principal é traçar metas inteligentes para o seu treinamento, preparação e alimentação – e cumpri-las à risca. Um exemplo: na época em que eu estava treinando para o MMA, eu planejei fechar minhas terças e quintas com um treino de escadaria, nove da noite. Chegou numa quinta, eu tinha acabado de dar aulas e me vi esgotado – e não fui. Decidi ir para casa, comer e descansar. Fiz o meu rango, deitei na cama, e quando deu umas onze da noite, aquilo começou a me incomodar demais, me achei um cabeça fraca por não ter ido. Pus na hora o tênis, desci para a ladeira íngreme perto da minha casa e fui correr: era meia-noite e eu estava lá, subindo dez vezes correndo a ladeira. Depois dormi em paz.

Como um praticante deve perseguir diariamente o tal “Jiu-Jitsu completo”?

Para isso é vital treinar todos os fundamentos básicos do Jiu-Jitsu. É o primeiro grande passo, afinal ninguém começa construindo uma casa pelo telhado. Vejo vários graduados fazendo posições mirabolantes e acho que elas têm seu lugar, mas não adianta isso se, quando forem exigidos, eles não souberem executar o básico que salva. O Jiu-Jitsu fundamental deve ser muito bem aprendido, para que seja bem ensinado. E é o básico que ajuda a gente a se virar em qualquer sufoco.

Como eram seus treinos diários?

Eu acho que na academia o principal mandamento é treinar sem motivação de ganhar. Obviamente que, se o treino for de elite, com companheiros de competição e com um cara do seu peso e nível, vale treinar para ganhar. Mas ninguém deve treinar pela vaidade de finalizar os menos graduados ou caras que sejam mais leves ou menos técnicos, ou que não estejam na mesma “pegada” que você. Em vez de passar uma hora ali amassando novatos, apenas em posições confortáveis, recomendo que o aluno seja objetivo. Isto é, que use o ponto forte de cada companheiro da academia… Se um camarada sabe derrubar, troque em pé com ele; se ele tem uma passagem forte, teste sua guarda e raspagem contra o cara… Isso é o que nos faz evoluir, e saber se virar seja qual for o jogo do adversário. Se durante esse caminho você batucar, for raspado, tomar uma queda ou tiver a guarda passada, lembre-se: o verdadeiro campeão se testa o tempo todo no campo de batalha.

Você sempre tirou suas dúvidas?

Sim, acho que um dos segredos do Jiu-Jitsu é estar atento. Procure ouvir seu mestre! Pergunte, questione, seja interessado quando ele estiver mostrando alguma posição ou algum detalhe específico. Não fique distraído ou tenha a soberba que sabe tudo – o atleta esperto aprende até com um faixa-branca mesmo sendo um faixa-preta. Procure sempre um graduado por perto e tire todas as suas questões na hora.

E a parte de quedas, como foi seu caminho para ser bom derrubador?

Eu comecei criança no judô, mas depois de anos de Jiu-Jitsu percebi que estava ficando defasado. O que fiz? Bati lá no Minas Tênis Clube e pedi para treinar com os melhores judocas da cidade. Jamais fazia chão com eles, eu queria era aprender com eles a resistir às quedas. Assim, quando enfrentava um não especialista, era muito mais fácil quedar. Muitos lutadores de Jiu-Jitsu não gostam de treinar esse fundamento, mas mesmo que o camarada tenha uma guarda praticamente intransponível, em algum momento vai precisar ter a opção de cair por cima. Todo campeão que desejar ser o número um, portanto, precisa treinar em pé.

Você continua treinando em alto nível, tanto que em 2014, mesmo como master 3, foi campeão brasileiro no peso e absoluto sem kimono – no adulto! O que recomenda para o praticante que deseja turbinar o gás?

É preciso realizar uma preparação física boa – útil também para evitar contusões e aumentar sua força e resistência para fazer tudo que sua cabeça mandar na hora do combate. Com o físico em dia, a mente flui na hora H. A preparação mental é outro aspecto muito importante. Costumo falar para meus alunos que no campeonato o pensamento tem de ser o seguinte: “Nada vai me tirar do meu objetivo hoje! Nada! Eu vim para vencer! Fome, cansaço, insegurança, receio, números de lutas, espera, torcida… Nada vai tirar meu foco!” O lance é entrar numa bolha de concentração e fazer tudo o que você treinou da maneira mais perfeita possível, sem errar. O resultado é consequência.

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